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LIVRO

               ‘O REI DAS SETE ESPOSAS’ É A NOVA OBRA DE

               ANABELA LEAL DE BARROS  QUE DÁ A CONHECER

               CONTOS TRADICIONAIS TIMORENSES


               T          imor é um hino à vida”. Anabela Leal de Barros, professora   têm uma relação muito próxima com a Natureza e com os animais, que têm
               Texto: Marta Amaral Caldeira


                                                                       especial valor simbólico, e esse é um aspeto cultural altamente distintivo”,
                          de Linguística Histórica da ELACH (Escola de Letras, Artes
                          e Ciências Humanas) da Universidade do Minho (UMinho)
                                                                       destaca a docente.
                          e investigadora do Centro de Estudos Humanísticos, aca-
                          ba de apresentar mais uma obra que celebra a identidade
                                                                       fixação do texto, anotação, estudo e publicação é de grande relevância em
                          timorense, numa sessão realizada na Biblioteca Lúcio Cra-  Ora, este trabalho de recolha e recuperação das estruturas narrativas, de
               veiro da Silva, em parceria com o Centro de Estudos Lusíadas/Conselho   termos culturais, pois, “os contos de um país, além de muito interessantes,
               Cultural da Universidade do Minho. Intitulado ‘O Rei das Sete Esposas –   servem, sobretudo, para conhecer o seu povo, as suas ansiedades ou os
               Contos e Lendas de Timor Leste’, o livro inclui dezenas de histórias que fa-  seus medos, os seus sonhos, dificuldades e expetativas, isto é, a sua menta-
               zem parte do imaginário do povo, comprovando que a literatura tradicional   lidade e identidade enquanto povo”.
               timorense tem como base a oratura (transmissão via oral).   Anabela Leal de Barros recordou que a UMinho teve os primeiros profes-
                                                                       sores a lecionar na Licenciatura em Língua Portuguesa em Timor Lorosae
               Trata-se de narrativas que são memorizadas pelo povo e vão sendo trans-
               mitidas oralmente de geração em geração, de estrutura e vocabulário rela-  em 2002/03 e os primeiros alunos eram bilingues ou multilingues, muitos
               tivamente simples, favorecendo a memorização, embora as recolhidas em   deles já então septuagenários, mas desejando muito aprender a dominar
               meados do século XX por padres como Artur Basílio de Sá (1961) ou Eze-  corretamente a língua portuguesa. “O comum é que cada timorense fale,
               quiel Pascoal (1967) revelem uma fixação de texto com interferência literá-  pelo menos, quatro línguas diferentes e o que acontece é que, muitas ve-
               ria, indica a autora da obra, escrita em co-autoria com o timorense Manuel   zes, ingressam na escola e é só aí que têm, pela primeira vez, contacto com
               Gomes de Araújo. Mencionando uma frase da jornalista do Hoje Macau   a língua portuguesa”, assinala a investigadora, acrescentando que aqueles
               Isabel Castro, na entrevista que lhe fizera a propósito do lançamento em   que falam o português mantêm ainda traços e vocabulário do século XVI,
               Macau do seu segundo livro, Rumando de Lés a Leste. Contos e Lendas   ou seja, dão ainda notícia do português falado na época em que o seu terri-
               de Oecusse (COD, 2017), “um livro cheio de gente”, a autora refere que   tório foi ‘descoberto’ pelos portugueses.
               “tudo tem direito a viver e a estar, na cultura timorense”, e esse é um dos   Os professores, os antigos militares ou guerrilheiros e os catequistas timo-
               valores que perpassam também pelas histórias que vão sendo contadas,   renses, enquanto informantes, têm sido “essenciais” ao nível do trabalho de
               tendo como protagonistas não só seres humanos, mas igualmente os mais   recolha dos contos, que tem sido feito com a preocupação de abarcar timo-
               diversos animais, desde a lagartixa e o toqué ao galo – um fiel companheiro   renses de todas as idades, profissões e lugares de naturalidade.
               do homem, tal como o cão, que em muitos destes contos é quem salva o
               dono de uma situação de perigo, ou até mesmo o crocodilo. “Os timorenses                             Continua












































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