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ENTREVISTA
Sou contra tantos cursos
de teatro em Portugal. É
um subterfúgio. Quando as
universidades e as outras
escolas não sabem o que
fazer aos professores, para
não os mandarem para fora,
criam cursos de teatro. Só
em Portugal há mais de 35
cursos. Isto quer dizer que
por ano saem qualquer coisa
como 400 pessoas que vão
para o desemprego. Isto é
alguma estratégia?
A ideia que passa é que a Companhia de Teatro Quanto é o orçamento anual da CTB? A Universidade do Minho tem um curso de teatro.
de Braga depende muito do poder municipal. Como olha para esta aposta?
Concorda? Cerca de 600 mil euros. Sou contra tantos cursos de teatro em Portugal. É
Essa sua pergunta pode ser reenviada para a inca- Sendo um homem de esquerda, sente-se preju- um subterfúgio. Quando as universidades e as ou-
pacidade política dos gestores políticos de Braga dicado? tras escolas não sabem o que fazer aos professores,
ao longo dos anos. A Companhia nunca dependeu A minha relação com o Mesquita Machado é a para não os mandarem para fora, criam cursos de
da Câmara de Braga. Nem depende. Isso é uma mesma que tenho com o Ricardo Rio. E será as- teatro. Só em Portugal há mais de 35 cursos. Isto
história mal contada, por interesses desonestos. O sim com todos. Nunca interferiram na Companhia quer dizer que por ano saem qualquer coisa como
que existe, no princípio, é um protocolo estabele- nem o poderiam fazer. A Manuela Ferreira Leite, 600 pessoas que vão para o desemprego. Isto é al-
cido com a Câmara Municipal de Braga onde esta quando era Ministra, dizia: “quem manda, paga!”. guma estratégia?
assume garantir, em dinheiro, 10% do financia- Ora eu em Braga estou à vontade. O que faria se mandasse?
mento que a Companhia conseguisse do Minis-
tério. Isto quer dizer que, praticamente nunca foi Em 1996, a convite do Governo (Ministério da Reduziria ao mínimo os cursos e dava-lhes condi-
cumprido, ainda hoje, em dinheiro vivo, a Câmara Cultura) integrou um grupo de trabalho que es- ções para fazerem bons cursos de teatro. Cursos a
paga 18 mil euros. Este valor nem dá para pagar tudou a situação do teatro em Portugal. O que sério, com prática teatral.
metade dos salários. Todos os partidos políticos sa- ficou que tivesse valido a pena? Há 10 anos defendia que Braga devia pensar criar
bem disto. E só não dizem porque são desonestos Foi um grupo de trabalho importante. Honrou-me equipamentos complementares ao Theatro Cir-
politicamente. Não lhes interessa saber a verdade. muito ter sido convidado onde fizemos um tra- co. Mantém a posição?
A verdade tem a ver com a defesa de um modelo balho sério. Porém, foi ‘tudo para a gaveta’ como
de gestão para o Theatro Circo, ao arrepio da fami- acontece em Portugal. Penso exatamente o mesmo. O que mudou é que
gerada ‘lei Relvas’. Braga há 10 anos tinha 150 mil habitantes e agora
Como está a acompanhar o facto de Braga ser a tem mais de 200 mil. Sabe quantas pessoas chega-
Qual é a sua explicação? Capital Portuguesa da Cultura? ram, no último ano, a Braga? Mais de 30 mil. Eu não
Essa pergunta deve ser feita aos partidos. O que Tinha muitas coisas a dizer. Por exemplo, foi anun- posso conceber como a Universidade de Braga não
tem um equipamento cultural. Não tem uma área
acho é que a política em Braga é feita com compa- ciado que a Universidade iria fazer um estudo de de cultura. Sabe porquê? Porque os estudantes
drios e não com política. A política em Braga, como públicos. E eu pergunto: Para quê se não houve bebem copos à volta da Universidade e ao fim de
no resto do país, faz-se cada vez pior. As pessoas um estudo de públicos nos últimos 10 anos. Isto semana vão embora. Não há nenhum interesse ob-
não assumem nada. As pessoas não têm memória. são coisas avulsas, sem estratégia, só por interesses jetivo sobre a política cultural da Universidade. Mas,
Não é só em Braga. Brinca-se com a vida das pes- momentâneos. Este estudo vale zero para mim. durante anos, a Universidade serviu como contra-
soas. Depois da II Guerra Mundial, a Europa ‘em- Isto é uma abstração. A Companhia nem ganhou, poder sobre a cidade. Falta uma geração de equipa-
bebedou-se’ e agora está a ter a ressaca. Estamos nem perdeu. Não me entristece e às vezes até me mentos práticos, simples, baratos…nas Andorinhas,
na miséria humana e intelectual. em Maximinos. Falta criar uma rede de desenvolvi-
beneficia. O que acontece é a ‘espuma dos dias’.
Não consegue disfarçar a dor que sente… Eu não estou de acordo com muita coisa que está mento cultural e criação artística. O país ainda não
a acontecer na ‘Braga – Capital Portuguesa da Cul- tem interlocutores políticos capazes de perceber
O que sei já lhe disse: a Companhia recebe da Câ- tura’. Era a resposta que que queria que eu disses- que uma coisa é a criação artística, outra é animação
mara 18 mil euros. Eu posso falar de outras (Coim- se? Aí a tem. cultural. Confundem tudo! Olhe…escreva isto: ‘po-
bra, Viana do Castelo, Almada…) que recebem dem-se bater punhetas, mas nunca se fode!’ Há 20
200 mil euros. anos que é assim. Braga tinha de precaver o futuro.
#SIMatuaREVISTA OUTUBRO · 2025 15