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JUSTIÇA
Vivo com a minha namorada há cinco anos. Temos
uma relação estável e feliz, mas nunca sentimos
grande urgência em casar. Ultimamente, temos
falado mais sobre o assunto e não sei se vale a pena
formalizar a relação ou se devemos continuar como
unidos de facto. O que muda realmente entre o
casamento e a união de facto?
C CASAR OU NÃO CASAR, EIS A QUESTÃO
aro leitor,
riu ou eventualmente contribuiu.
Eis-nos em junho, mês de festas e celebrações,
O casamento, por sua vez, é um contrato formal
de manjericos nas janelas e promessas partilha-
que requer a vontade declarada perante o Esta-
do e uma moldura jurídica clara. Permite também
das ao som dos arraiais. Junho, mês de Santo An-
tónio, o casamenteiro, que, mais do que promo-
escolher um regime de bens – comunhão de ad-
ver alianças, convida a refletir sobre o lugar que
quiridos, comunhão geral, separação ou um regi-
damos ao outro na nossa vida.
é comum e o que permanece na esfera patrimo-
A questão evocada pelo leitor surge, por isso, em
nial de cada um dos cônjuges. Em caso de disso-
boa hora: após cinco anos de vida em comum me próprio –, estabelecendo com precisão o que
lução por divórcio ou morte, os direitos e deveres
com a sua companheira, pergunta-se se deverão estão previamente definidos, oferecendo maior
manter-se em união de facto ou dar o passo do previsibilidade e proteção para ambas as partes.
casamento.
No entanto, para além do aspeto jurídico, há ain-
A resposta não é simples nem universal, mas é útil
conhecer as diferenças entre estas duas figuras da lugar a uma dimensão simbólica e relacional
jurídicas que, embora próximas no quotidiano, que o casamento consagra. Para muitos, o ato de
assumem naturezas distintas no olhar do Estado casar representa a decisão consciente de assu-
e da sociedade. mir um lugar na vida do outro, reconhecendo-o
diante da comunidade. Não é apenas uma forma-
A união de facto é o reconhecimento legal de lidade, mas antes um gesto que estrutura, orga-
uma convivência estável, duradoura e com proje- niza e que dá lugar. Escolher entre o casamento
to de vida comum. Basta viverem juntos há mais e a união de facto é também, por vezes, escolher
de dois anos em condições semelhantes às dos o lugar que se quer ocupar dentro da estrutura
cônjuges, partilhando casa, responsabilidades e familiar herdada e da sociedade. É uma escolha
afeto. Para que produza efeitos legais, esta união que, para além do plano jurídico, pode refletir di-
deve ser reconhecida, com uma declaração emi- nâmicas mais profundas: pertença, compromisso,
tida pela junta de freguesia onde o casal vive, lealdade, liberdade e equilíbrio.
acompanhada de provas documentais simples. Na escolha entre o casamento e a união de facto,
Comprovada a união de facto, há um aumento de o que deve prevalecer é o momento que vivem e
direitos, nomeadamente, a possibilidade de en-
Dra. Filipa Menezes tregar o IRS em conjunto, beneficiar de proteção o que desejam criar. Pode ser que, para vocês, a
ADVOGADA na casa comum, licenças laborais equiparadas às união de facto seja a forma mais livre e verdadeira
de estarem juntos. Por outro lado, pode ser que o
do casamento e, em caso de morte, acesso a sub- casamento venha selar algo que já existe e que,
sídios e à pensão de viuvez. No entanto, apesar
destas aproximações, a verdade é que a união ao ser nomeado, ganha ainda mais força.
de facto não confere o mesmo grau de proteção O importante é que a escolha seja vossa, refleti-
nem as mesmas garantias em matéria de herança da, coerente com o que vivem e com o que dese-
ou de partilha patrimonial. Em caso de separa- jam para o futuro. Junho lembra-nos que o amor,
ção, não há um regime legal de divisão de bens, para florescer, precisa tanto de liberdade como
sendo que tudo dependerá das provas que cada de compromisso e que qualquer das opões pode
um conseguir fazer relativamente ao que adqui- ser fértil, desde que nasça da verdade partilhada.
84 JUNHO · 2025 #SIMatuaREVISTA