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REPORTAGEM REPORTAGEM
“Criação
artística
deve ser mais
valorizada”
“O mérito deve ser premiado em todas as áreas, por isso, reconheço de ‘Ilhas’. “Recordo-me de ser criança e estar ao colo da minha mãe a
como exemplar esta iniciativa promovida pela Câmara Municipal de aprender a ler. Julgo que o facto de ter aprendido a ler foi, muito prova-
Câmara de Lobos de valorização da experiência de criação artística velmente, a experiência mais marcante da minha vida, até porque a mi-
com a instituição do Prémio João Augusto d’Ornelas – um escritor ro- nha própria organização mental é sempre uma organização de escrita,
mântico câmara-lobense, do séc. XIX, pouco conhecido, que, por via como se fosse uma fita de uma máquina de escrever”.
desta atividade cultural, divulga a sua obra às novas gerações, perpe-
tuando a sua memória e prestando-lhe a devida homenagem”, desta- Para a docente de Literatura Grega da UCP-Braga, os livros não são
ca Ana Paula Pinto, que acaba de receber o prémio, no valor de 2000 meros objetos de ornamentação de uma estante. Nunca foram e ga-
euros, para além da edição e publicação da obra, que estará a cargo rante que é necessário que as novas gerações “regressem” ao prazer
daquele município da Madeira. da leitura, da descoberta pelo livro. Vê na literatura e pelo meio da lite-
ratura uma imensidão de vantagens para o leitor assíduo. “Ler é muito
“Não há melhor forma de valorizar o talento e o entusiasmo”, confessa mais do que simplesmente ler. É poder viajar pelos mais diversos sítios,
a autora do conto ‘Ilhas’, frisando que só desta forma se podem poten- é ter a possibilidade de aprender muito sobre qualquer tema que se
ciar as ideias criativas. aborde em determinada obra literária, é adquirir melhores competên-
cias linguísticas, comunicacionais e interpretativas”.
É necessário que as novas gerações voltem a ganhar gosto pela
leitura Entendendo que as novas gerações preferem as consultas rápidas, as
fontes ligeiras e o prazer dos jogos digitais, substituindo o “prazer da
O pasmo com que recebeu a notícia de que havia ganhado o prémio busca” que só uma biblioteca pode oferecer, Ana Paula Pinto aponta
foi tal que aquando do telefonema que recebeu da autarquia madei- para a necessidade de voltar a estimular as crianças e os jovens, bem
rense, a felicitá-la pelo feito, considerou mesmo “ter sonhado”. Mas há como os adultos, para a leitura e para o prazer do livro, sobretudo, no
muito que Ana Paula Pinto partiu à conquista do seu espaço literário, contexto atual, com a emergência da Inteligência Artificial, que incen-
confessando que a escrita a interessa e motiva desde tenra idade.
tiva a cultura do facilitismo, do tratamento dos temas pela superficiali-
“Lembro-me de ser muito pequena e invejar esta capacidade tauma- dade e da não verificação de fontes, optando-se pelo que se apresenta
túrgica de ler os hieróglifos que os mais velhos tinham e quando fui como resultado numa simples pesquisa que, não raras vezes, induz ao
capaz de decifrar as letras senti uma enorme alegria”, conta a autora erro fácil.
22 OUTUBRO · 2024 #SIMatuaREVISTA