Page 14 - SIM 290
P. 14
REPORTAGEM
Arminda Fernandes, 55 anos de casa: “Não consigo sair daqui esta que têm para venda. Os botões, as linhas e fios, os apliques e ilhós sempre
é a minha casa” em cima do balcão, são alvo dos olhares minuciosos das clientes que sa-
bem bem o que querem e que vão continuar a ir à Casa Pereira das Violas,
Arminda Fernandes já está reformada, mas continua a trabalhar na Casa porque ainda é o “Tem Tudo” – enquanto lhe permitirem ser.
Pereira das Violas, há 55 anos sem interrupção. Chegou jovem, aprendeu
todos os segredos do ofício (é a funcionária com mais anos de casa) mas De geração em geração, de pais para filhas, a Casa Pereira das Violas con-
não consegue ir embora. “Isto é o que me dá vida. Não consigo ir embora. tinua a fazer o seu caminho com vontade de acrescentar mais 100 anos
O que vou fazer para casa? Olhar para as paredes? Eu cresci aqui, namo- aos que já passaram.
rei, casei, tive filhos, tive netos, e cá estou eu”, explica.
Quando faz um paralelo do momento em que entrou para a atualidade, a
funcionária afirma que “não há comparação. Hoje ninguém cose um bo-
tão, ninguém faz uma bainha… houve uma época em que se recuperavam
os tecidos, agora é comprar e deitar fora. Braga tinha vestuário com qua-
lidade, hoje já não há e os que há não são para qualquer bolso”, defende
Arminda Fernandes.
A funcionária recorda que, quando entrou, as férias não estavam disponí-
veis todo o ano (muito menos, nos meses de Verão) e que quando o fluxo
de clientes “apertava”, eram contratadas jovens que trabalhavam durante
as férias escolares, para ajudar a tanta procura. Os emigrantes eram clien-
tes fiéis e regulares, mas também esses foram desaparecendo.
Em relação ao negócio, por vezes sente-se entre a ‘espada e a parede’ na
relação com o cliente. “Ao longo dos anos, criámos relação com os nossos
clientes, sabemos o que compram, o que procuram, a qualidade que que-
rem. Atualmente, temos outro problema que afeta muitos dos artigos que
vendemos e que tem a ver com os prazos de entrega das encomendas.
Temos clientes que procuram determinados produtos, mas a quem não
conseguimos dar resposta, porque o fornecedor não dá prazo de entre-
ga para aquilo que pedimos. Nós gostávamos de satisfazer a necessidade
do cliente, mas simplesmente não podemos, porque o fornecedor não
consegue cumprir – e quando consegue, inflaciona exageradamente os
preços. Dou-lhe um exemplo: das fraldas de bebé, um produto nacional
de excelente qualidade que sempre vendemos, já estamos à espera des-
de setembro e não há previsão de entrega. É muito desafiante para nós”,
conta.
Sem data para deixar a profissão, Arminda e as colegas de trabalho conti-
nuam a receber com um sorriso, enquanto exibem com orgulho os artigos
14 JANEIRO · 2024 #SIMatuaREVISTA