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REPORTAGEM








































               Arminda Fernandes, 55 anos de casa: “Não consigo sair daqui esta   que têm para venda. Os botões, as linhas e fios, os apliques e ilhós sempre
               é a minha casa”                                         em cima do balcão, são alvo dos olhares minuciosos das clientes que sa-
                                                                       bem bem o que querem e que vão continuar a ir  à Casa Pereira das Violas,
               Arminda Fernandes já está reformada, mas continua a trabalhar na Casa   porque ainda é o “Tem Tudo” – enquanto lhe permitirem ser.
               Pereira das Violas, há 55 anos sem interrupção. Chegou jovem, aprendeu
               todos os segredos do ofício (é a funcionária com mais anos de casa) mas   De geração em geração, de pais para filhas, a Casa Pereira das Violas con-
               não consegue ir embora. “Isto é o que me dá vida. Não consigo ir embora.   tinua a fazer o seu caminho com vontade de acrescentar mais 100 anos
               O que vou fazer para casa? Olhar para as paredes? Eu cresci aqui, namo-  aos que já passaram.
               rei, casei, tive filhos, tive netos, e cá estou eu”, explica.
               Quando faz um paralelo do momento em que entrou para a atualidade, a
               funcionária afirma que “não há comparação. Hoje ninguém cose um bo-
               tão, ninguém faz uma bainha… houve uma época em que se recuperavam
               os tecidos, agora é comprar e deitar fora. Braga tinha vestuário com qua-
               lidade, hoje já não há e os que há não são para qualquer bolso”, defende
               Arminda Fernandes.
               A funcionária recorda que, quando entrou, as férias não estavam disponí-
               veis todo o ano (muito menos, nos meses de Verão) e que quando o fluxo
               de clientes “apertava”, eram contratadas jovens que trabalhavam durante
               as férias escolares, para ajudar a tanta procura. Os emigrantes eram clien-
               tes fiéis e regulares, mas também esses foram desaparecendo.
               Em relação ao negócio, por vezes sente-se entre a ‘espada e a parede’ na
               relação com o cliente. “Ao longo dos anos, criámos relação com os nossos
               clientes, sabemos o que compram, o que procuram, a qualidade que que-
               rem. Atualmente, temos outro problema que afeta muitos dos artigos que
               vendemos e que tem a ver com os prazos de entrega das encomendas.
               Temos clientes que procuram determinados produtos, mas a quem não
               conseguimos dar resposta, porque o fornecedor não dá prazo de entre-
               ga para aquilo que pedimos. Nós gostávamos de satisfazer a necessidade
               do cliente, mas simplesmente não podemos, porque o fornecedor não
               consegue cumprir – e quando consegue, inflaciona exageradamente os
               preços. Dou-lhe um exemplo: das fraldas de bebé, um produto nacional
               de excelente qualidade que sempre vendemos, já estamos à espera des-
               de setembro e não há previsão de entrega. É muito desafiante para nós”,
               conta.
               Sem data para deixar a profissão, Arminda e as colegas de trabalho conti-
               nuam a receber com um sorriso, enquanto exibem com orgulho os artigos


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