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CRÓNICA


                                       O PORTUGUÊS TURISTA


                                       NO PRÓPRIO PAÍS
               H                       á  uma  nova  moda  nas  cidades  portuguesas:  a   Não é justo. Uma taxa turística devia ser pensada





                                       “taxa turística”. Cada dormida num hotel, numa
                                                                                  para quem vem de fora, para quem utiliza inten-
                                                                                  samente os recursos da cidade sem contribuir
                                       pensão ou num alojamento de curta duração
                                                                                  previamente para eles. Não para quem cumpre
                                       paga um extra para compensar o impacto do tu-
                                                                                  obrigações profissionais, familiares ou de saúde.
                                       rismo. Em teoria, parece razoável. Na prática, é
                                       incoerente. Os portugueses pagam-na, mesmo
                                       quando não estão de férias.
                                                                                  passar férias fora. Por vezes, é mais económico
                                       Pensemos nisto: um trabalhador que passa a se-
                                                                                  do que ficar em Portugal, mesmo pagando taxas
                                       mana em Faro para participar numa formação;   Não admira que tantos portugueses prefiram
                                                                                  noutros países. Mas não se trata apenas de di-
                                       uma família que se desloca ao Porto para visitar   nheiro. Trata-se de identidade, de pertença, do
                                       familiares; alguém que pernoita em Lisboa para   vínculo pelo nosso lar, pelas nossas tradições e
                                       realizar tratamentos médicos, ir a uma consulta   cultura das nossas gentes.
                                       ou visitar um familiar hospitalizado. Nenhum de-  Portugal pertence aos seus cidadãos. Conhecer o
                                       les procura lazer. Nenhum deles é turista, e, no   nosso país deveria ser um direito, um prazer, um
                                       entanto, todos pagam como se o fossem.
                                                                                  orgulho. Não um encargo.
                                       O problema não é apenas monetário. É de prin-  Talvez, um dia, possamos conhecer as nossas ci-
                                       cípio. Pagamos impostos nos nossos concelhos,   dades e sentir que pertencemos verdadeiramente
                                       nos nossos distritos, no nosso país. E, ainda assim,   a cada rua, a cada praça, a cada recanto do nosso
                                       quando circulamos dentro das nossas fronteiras,   país sem nos sentirmos turistas na nossa própria
                                       somos tratados como estrangeiros. Duplamente   pátria, mas sim o cidadão.
                                       tributados: primeiro como cidadãos, depois como
                                       “turistas involuntários”.

















               Fátima Campos




























               #SIMatuaREVISTA                                  OUTUBRO · 2025                                            71
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