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REPORTAGEM

























































               Arte, ciência e poesia de mãos dadas                   sinta que algo mudou. É tertúlia, é aventura, é laboratório de alma.
                                                                      Hoje, há quem lhe chame “movimento”. Porque há regularidade e
               Não havia método, nem regras rígidas. Apenas um convite: parti-  sentimento de grupo. Mas Paulo Esse prefere deixar isso em aber-
               lhar. Arte, ciência, cultura, inquietação. Desde então, o FFBB recu-  to: “Cada um leva disto o que entender, respeitando a lógica da di-
               sou tornar-se fórmula. É metamorfose: muda o lugar, muda o tema,   versidade e as aventuras de cada um.”
               mudam as caras — e ainda assim, há algo que permanece. Não é um
               clube. É um caos gentil.                               No fim, o FFBB é um pouco como a própria cultura: escapa-se a
                                                                      definições, habita o intervalo entre as palavras, vive do que se cria
               Ao longo dos anos, as sessões do FFBB aconteceram em livrarias,   entre as pessoas. É uma forma de estar. De sentir. De pensar. De
               museus, bares, jardins e trilhos de areia. Já se disseram poemas no   ser. O FFBB é uma forma de resistência à pressa. Um espaço onde
               Museu Nogueira da Silva e discutiu-se o riso em jantares literários.   a palavra pode ser demorada. Onde a emoção é legítima. Onde se
               Já se pensou Miguel Torga e Natália Correia. Já se caminhou entre   pode errar, repensar, rir, silenciar. A poesia que ali se diz é corpo:
               Vila Praia de Âncora e Moledo com poesia nos bolsos e farnel par-  fala de amor, de amizade, de política, de tempo, de morte e de nas-
               tilhado. Já se improvisou. E, acima de tudo, já se sentiu.
                                                                      cimento. É tudo — como são todas as artes. E é essa provocação
               Apesar de ter começado pela poesia, o FFBB alarga-se com natu-  que orienta tudo: desafiar o pensamento, criar dúvidas, estimular o
               ralidade. A ciência nunca ficou de fora — há fascínio, respeito, diá-  espírito crítico, e — por que não? — ajudar a viver melhor. Mas sem
               logo. O pressuposto comum a todas as atividades é simples, mas   pretensões  curativas.  A  transformação  acontece  de  dentro  para
               ambicioso: estimular o pensamento, criar dúvidas, fomentar o espí-  fora. O FFBB não salva ninguém — mas convida cada um a encon-
               rito crítico e, quem sabe, ajudar cada um a ser um pouco mais feliz.  trar os seus próprios remédios.
               Não há um lugar fixo, nem um grupo fechado, nem sequer um for-  Nos últimos anos, muitos começaram a chamar ao FFBB um “movi-
               mato. A única regra do FFBB é a liberdade. E é precisamente isso   mento”. Paulo hesita. Prefere deixar em aberto. Porque movimen-
               que o torna vivo. Este é um movimento de ideias em trânsito. Mais   to, sim, no sentido da pulsação. Mas nunca como estrutura rígida..
               do que encontros: experiências. Não é raro quem vá uma só vez e


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