Page 56 - SIM 311
P. 56
VILA VERDE
Vila Verde ferve em aromas
SABARIZ TRANSBORDOU SABORES
ANCESTRAIS NA FESTA DO CALDO DO POTE
O cheiro a lenha e o borbulhar de potes de ferro trans- Sabariz saiu com a certeza de que a tradição, quando bem temperada, é ca-
Texto: Patrícia Sousa
paz de surpreender até os paladares mais exigentes — e que um simples pote
formaram a freguesia de Sabariz, no concelho de Vila
pode contar histórias que atravessam continentes.
Verde, num epicentro gastronómico improvável, onde
mais de 2.000 litros de caldo percorreram o caminho da
O que torna esta festa verdadeiramente única não são apenas os 26 caldos
tradição à modernidade. A Festa do Caldo do Pote vol-
tou a reunir cozinheiras e cozinheiros locais, emigrantes
os próprios potes: entre eles, um gigante com 150 litros, trazido diretamente
e visitantes curiosos, numa celebração do mundo rural que já se prepara diferentes, preparados sem varinhas mágicas nem enlatados, mas também
para cruzar fronteiras. Em novembro, a tradição chega a Dusseldorf, na de um comércio de antiguidades e que já serviu exércitos suíços em campa-
Alemanha. nhas passadas. Ele junta-se aos cerca de 30 outros potes, com capacidades
que variam entre 30 e 100 litros, cada um fervendo ao ritmo da tradição.
Um convite irresistível que sobe das fogueiras a lenha espalhadas pelo re-
cinto, misturando couves, feijões, batatas, repolho, nabos, nabiças e carnes Entre pataniscas, bifanas e caldos de migas com feijão, rabo de boi, ossobuco
campestres num perfume que lembra histórias antigas e almoços de domin- ou até caldo de ministros, cozinheiros e cozinheiras de Sabariz e freguesias
go. O calor das fogueiras deram origem a 26 caldos diferentes, incluindo o vizinhas mostraram que saberes rurais e sabores de antigamente podem
inovador caldo de migas com feijão, o clássico caldo de bacalhau e até o ou- conviver lado a lado com inovação. Em cada colher, não faltou produtos da
sado caldo de ossobuco com feijão moleiro. terra, colhidos por mãos que conhecem cada curva do campo e cada história
da aldeia.
O evento, que faz parte da programação “Na Rota das Colheitas” do Municí- E não é só local: emigrantes de Sabariz trouxeram receitas de longe, a festa
pio de Vila Verde, não se limitou a caldos. Pataniscas de bacalhau, bifanas e internacionalizou-se e já tem réplica marcada em Düsseldorf, na Alemanha,
vinhos verdes completaram a festa, que contou com a participação de mais a 9 de novembro. Entre cada gole, os visitantes provaram mais do que caldo:
de seis dezenas de voluntários e atraiu muitas pessoas curiosas e ansiosas por saboreiam tradição, cultura e um pedaço vivo da história rural de Vila Verde.
provar as receitas à moda antiga, “sem varinhas mágicas, nem enlatados”.
Mais do que comida, a festa, que é organizada pela Junta de Freguesia e Para quem entrou com uma malga na mão — símbolo oficial do evento — a
pela Associação Popular de Sabariz, com o apoio do Município de Vila Verde, tarde tornou-se um mergulho livre pelos sabores da terra, celebrando a vida
mostrou saberes ancestrais, reforçou laços comunitários e transformou o ato ao ar livre, o convívio e a magia de cozinhar no pote de ferro sobre o lume.
de cozinhar num ritual que recupera a memória do campo. Quem passou por Sabariz foi mais do que uma aldeia: foi uma panela de histórias, aromas e me-
mórias que continuam a ferver, ano após ano.
56 OUTUBRO · 2025 #SIMatuaREVISTA

