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ENTREVISTA



                 Quase uma década fora do país. Como ca-
               rateriza esses anos?
                 Foram duros. Desde o início até estar em alta.
               Há  uma  pressão  muito  grande  para  aguentar.
               Por exemplo, quando fui Christine, já como pro-
               tagonista, foram três anos e meio. Fiz seis espe-
               táculos por semana. Todos esgotados. É dose.
               Foi um papel com muita exigência…é como ser
               um atleta de alta competição. É um espetáculo
               ao vivo, tudo sem rede. Lindo, maravilhoso, mas
               duro. Todos os dias era uma vitória. É viver só
               para aquilo e ter todos os cuidados básicos com
               a voz e a saúde física. Exige muita disciplina.
                 Como cuida da voz?

                 Há várias coisas a fazer. Felizmente, tanto em
               Portugal como em Espanha, tenho médicos
               especialistas em voz cantada que me acompa-
               nham ao longo da minha carreira. É muito im-
               portante apoio e seguimento. A este nível, faço
               check-ups rotineiros. O percurso de apren-
               dizagem  nunca  acaba.  Continuo  a  ter  aulas,  a                       confiança mútua, até porque nós temos contacto
               fazer workshops, importante ter um par de ou-                             com outras pessoas, até a nível físico. Felizmente
               vidos fora para não adquirir vícios. Nunca fumei,                         temos as coisas bem assumidas. Estamos juntos
               nunca bebi álcool. Bebo água para manter as                               porque queremos mesmo estar juntos. Temos uma
               cordas hidratadas. Durmo bem e trabalho dia-                              base sólida. Em matéria de filhos, somos pais pre-
               riamente. Isto é como o ginásio. Se pararmos, o                           sentes.
               corpo começa a comportar-se de outra forma.   Sinto-me muito acarinhada
               Ter o conhecimento suficiente sobre o nosso                                Em 2022 lança o primeiro álbum de originais
               corpo, isto é, saber quando e como é que posso   pelos portugueses. Desde o   intitulado “Tanto Mais”. Saiu no momento certo
               fazer determinadas coisas. Felizmente, até hoje   momento que comecei a ser um   ou já poderia ter visto a luz do dia há mais tem-
               nunca tive nada sério. A minha “escola inglesa”   pouco mais conhecida, percebi   po?
               ajuda-me a gerir melhor os problemas.
                                                    o orgulho dos portugueses             Acho que as coisas acontecem quando têm de
                 Testemunhou exemplos de colegas que não   pelo trabalho que ia fazendo   acontecer. Tarde, para mim, não se aplica. Até essa
               souberam regular “o tempo da voz”?   em Inglaterra. De modo               data, não se tinham alinhado as estrelas da forma
                 Sim. Infelizmente, a grande maioria das pes-  particular dos vimarenenses. (…)   certa. Aconteceu da forma como eu queria fazer. O
                                                                                         “Tanto Mais” nasceu quando tinha de nascer, com
               soas  que  conheço  do  teatro  musical  já  teve   Guimarães tem aquele orgulho   o meu querido Renato Júnior que, infelizmente,
               nódulos, derrames, problemas muitas vezes de-  de eu ser deles. São bairristas.
               rivados do sobre uso, principalmente quando                               nos deixou há pouco tempo. Sinto-me muito hon-
                                                                                         rada por ter trabalhado com ele na produção do
               não se está bem. Com este comportamento po-  “Ela é nossa, nasceu e cresceu
               dem acontecer coisas más. E porquê? Porque   aqui”.                       meu disco e onde escreveu muitas canções que lá
               todos nós somos fáceis de substituir. Se alguém                           estão. Este disco sou eu. Não é uma coisa que te-
               se lesionar, se alguém tiver um nódulo e tiver de                         nha sido feita para agradar.
               parar dois anos…essa gente que contrata não   A juntar a este tanto, há ainda espaço para fil-  Este disco foi, também, um “salto de fé”?
               quer saber. A seguir contratam outra pessoa e   mes, séries e programas de televisão. Como se
               está tudo bem para eles. Isto ficou-me gravado.   concilia tanta solicitação?  Sim, sem dúvida. Feito com muito amor, com as
               É tipo o meu mantra. Já cancelei alguns concer-                           pessoas que eu queria muito que estivessem a tra-
               tos, felizmente não muitos.           Sempre demonstrei vontade em explorar outros
                                                    caminhos culturais. Os convites surgiram porque   balhar comigo. E agora já estamos a trabalhar num
                 Sente-se uma pessoa reconhecida em Por-  estou a ser bem-sucedida na minha área. Sempre   segundo disco. Penso que ainda vai sair este ano.
               tugal?                               gostei de atuar, embora a televisão seja um meio   Volta a ser mãe este ano. É o último sonho que
                                                    diferente. Senti-me sempre bem, gostei muito,
                 Sim. Sinto-me muito acarinhada pelos portu-  embora reconheça que a “minha praia” seja o pal-  faltava concretizar?
               gueses. Desde o momento que comecei a ser   co.                            Sim, é um sonho já com alguns anos. Foi um
               um pouco mais conhecida, percebi o orgulho
               dos portugueses pelo trabalho que ia fazendo   Está envolvida em muitas frentes. Como con-  processo  mais  complicado em  comparação com
               em Inglaterra. De modo particular dos vimare-  cilia a vida profissional com a pessoal?  o Gabriel (10 anos). Custou mais fazer acontecer.
               nenses e do público em geral. Tenho feito imen-                           Felizmente está a correr tudo bem. Vai nascer em
               sos concertos em Portugal e sou extremamen-  Tenho a sorte de ter um marido (Gonzalo Ramos)   junho. É um filho muito desejado e a vida não pode
               te acarinhada. Guimarães tem aquele orgulho   que está neste meio. É ator, por isso percebe. Este   parar. Já tenho coisas marcadas para meados de
               de eu ser deles. São bairristas. “Ela é nossa,   facto é uma grande vantagem, tanto para um lado   julho (risos). Irá comigo na “mochila”, como foi o
               nasceu e cresceu aqui” (risos). Saber que as   como para o outro. Ambos temos noção que pode   Gabriel. Vai dormir nos camarins, com muita gente
               gerações mais novas querem fazer teatro mu-  haver instabilidade, horários difíceis de gerir. O   a ajudar. Acaba-se por conseguir fazer as coisas. Os
               sical, deixa-me muito orgulhosa e ainda mais   nosso trabalho implica viajar muitas vezes. Quan-  miúdos depois habituam-se. Para o Gabriel é com-
               porque muitos pertencem a vilas ou cidades   do nos conhecemos já estávamos neste mundo ar-  pletamente normal ver o pai ou a mãe na televisão.
               pequenas. Sei que olham para mim como uma   tístico. Caso o contexto fosse diferente, reconheço   Sinto-me grata com tudo o que me acontece na
               prova de que é possível. É maravilhoso  que fosse mais difícil. É um mundo que tem de ter   vida.


               14                                               MARÇO · 2025                                 #SIMatuaREVISTA
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