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EM FOCO
SÍLVIA MOTA LOPES APRESENTA ‘ORGÂNICO’
NA BIBLIOTECA LÚCIO CRAVEIRO DA SILVA
A poetisa e pintora bracarense apresentou, publicamente, o seu
quinto livro de poesia, no âmbito da programação do Festival
Literário Utopia, realizado em novembro último, em Braga. “O
amor é que me move. Nunca desistam de sonhar”, apelou, na
sessão, Sílvia Mota Lopes.
Por: Marta Amaral Caldeira
É da mudez e, sobretudo, da inquietude da alma das mulheres, que a poetisa
e pintora bracarense Sílvia Mota Lopes fala na obra poética, intitulada ‘Orgâ-
nico’. A publicação, com o selo da ‘Poética Edições, foi apresentada recente-
mente, numa sessão pautada pela emoção das palavras, na Biblioteca Lúcio
Craveiro da Silva, no âmbito do Festival Literário Utopia, realizado, em novem-
bro último, em Braga.
Depois de Esboço (2017), Passei como um Sussurro para que escutasses o
Vento (2019), Túnica Íntima (2022) e Ofício Volátil da Memória (2023), a poe-
tisa dá à luz ‘Orgânico’, deixando-se ‘invadir’ pelas sonoridades das vozes que
lhe chegavam em catadupa ao interpretar com o seu pincel 15 mulheres es-
critoras portuguesas que ficaram registadas na história portuguesa pela luta pugnam pela defesa da mulher e da sua condição de ser humano livre”.
que travaram em prol da ascensão da mulher na sociedade. Mulheres de in- Cândido Oliveira Martins realçou, ainda, a “sensorialidade corporal” que os
teligência suprema, sofredoras do seu tempo, mas cuja bravura e sentido de poemas de Sílvia Mota Lopes convocam numa sucessão de imagens e de
independência permitiu desbravar um caminho mais livre para o sexo femini- sentidos despertos e destacou o “diálogo” que o livro estabelece com outras
no. Mulheres como a escritora bracarense Maria Ondina Braga e tantas outras. linguagens ao incluir oito ilustrações, da autoria de três jovens artistas: Alicia
Lino, Francisca Camacho e Francisca Graziani.
A nova obra poética de Sílvia Mota Lopes inscreve-se, precisamente, neste do-
mínio íntimo feminino, perseverante, reivindicativo e arrebatador. Leu, escutou “Tal como as abelhas levam a cabo um trabalho silencioso da polinização, es-
e, num ímpeto esmagador e inevitável, escreveu tudo o que lhe sussurravam as sencial para o equilíbrio da natureza, também os poetas são essenciais para a
mulheres que está a pintar. polinização da sensibilidade. É essa a utilidade da poesia”.
Com a apresentação de Cândido Oliveira Martins, professor de Literatura da POETISA BRACARENSE GALARDOADA NA GALIZA
Universidade Católica Portuguesa – Centro Regional de Braga, e as leituras de
poemas por Sandra Santos, Helena Maria Gonçalves e Anabela Carvalho, ao A pintora e poetisa bracarense Sílvia Mota Lopes foi, recentemente, distingui-
som da guitarra de Tiago Alberto e a canção pop de Lino André, a sessão de da na Gala da Ari(t)mar 2024 pelo poema Há mulheres que trazem, incluído
apresentação do livro ‘Orgânico’ revelou-se um momento cultural de elogio à na obra poética Ofício Volátil da Memória (2023), que ganhou o 1.º prémio
palavra poética e aos vários papéis que a mulher assume na sociedade. de poesia atribuído pela Ari(t)mar, no âmbito do Concurso da Melhor Poesia
Galega e Portuguesa. O poema da bracarense eleva-se num elogio à perse-
“O título da obra – Orgânico – cujo étimo latino significa natureza íntima, re- verança e resiliência das mulheres em geral, que em pleno século XXI, ainda
mete para algo que é fundamental, visceral, algo que está colado à pele. É isso precisam de reivindicar pelo seu empoderamento.
mesmo que se sente quando lemos os textos desta obra de Sílvia Mota Lopes”,
indicou Cândido Oliveira Martins. “Estes são textos que dialogam com outros A artista, que também é ilustradora e autora de literatura infanto-juvenil, rece-
textos e cabe ao leitor/a deixar-se impregnar, de forma orgânica e intensa”. beu o prémio no passado mês de novembro, em cerimónia solene realizada na
Galiza. “Estou imensamente feliz e emocionada por estar aqui, não somente
A passagem do silêncio à palavra escrita assume na escrita de Sílvia Mota Lopes pela seleção do meu poema do livro Ofício Volátil da Memória, e pela atribui-
“o magma da composição literária” por via do recurso a metáforas abundantes ção do prémio de melhor poesia portuguesa, mas também pela oportunidade
como “gestação de versos” ou “ventre feminino”, que conduzem o leitor/a, de representar tantas vozes femininas que foram deixadas na sombra da his-
sempre, à imagem do significado de ser mulher ontem, hoje e amanhã. “A obra tória. Nós temos a nossa história, social, política, cultural, literária e artística e
‘Orgânico’ de Sílvia Mota Lopes é uma espécie de busca por uma respiração durante muito tempo a história escreveu-se sem referir as mulheres. As mulhe-
partilhada, de uma mulher que se dirige a outras mulheres, como uma linha- res sempre viveram na sombra, numa sociedade em que o poder pertencia ex-
gem. Uma linhagem do feminino”, referiu o professor de Literatura, atentando clusivamente aos homens, invisibilizando-as ao longo dos séculos. Ainda bem
para o discurso metaliterário que o livro demonstra, ao evocar as vozes de ou- que houve mulheres insubmissas, rebeldes, abrindo caminho para que hoje a
tras escritoras, que, pela escrita, revolucionaram e marcaram, decisivamente, mulher tivesse um papel principal e ativo no mundo. Para bem de todos nós,
a sua época e que foram, e continuam a ser, “faróis”, “vozes da diferença que para bem da humanidade”, defendeu a artista bracarense na Gala da Ari(t)mar.
32 DEZEMBRO · 2024 #SIMatuaREVISTA