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ENTREVISTA ENTREVISTA
Como encontrou a Câmara de Braga quan- Que ‘medidas-chave’ começou por apli- 700 mil dormidas por ano, um número que tri-
do assumiu a presidência em 2013? car? plica o que existia antes da nossa chegada.
Não foi com grande surpresa porque, como Primeiro na área económica. Recordo que A partir dessa raiz económica quais foram
é sabido, já estava envolvido na vida munici- comecei por ser eleito num contexto muito di- as derivações?
pal há bastantes anos, quer como deputado fícil. Vivíamos em plena intervenção da Troika.
municipal, quer como vereador da oposição. O país tinha uma taxa de desemprego a ron- A justiça social. Aliás, eu sou conhecido, até
Quando assumi funções em 2013, na minha dar os 15%. Nos jovens licenciados rondava os mesmo no exterior, como o campeão dos ODS
terceira candidatura, já era um profundo co- 25%. Estávamos confrontados com uma fuga (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável),
nhecedor da realidade da Câmara Municipal. de talentos para o exterior. Dado este contex- ou seja, um modelo que olha para o território e
Mesmo assim, ainda foram descobertos alguns to e pelo meu perfil de economista, defendi que defende que o seu desenvolvimento tem
‘esqueletos no armário’. No entanto, as muitas que um modelo de desenvolvimento tem de de ser holístico e que tem de ser acautelado,
dificuldades que fomos encontrando não fo- assentar no crescimento económico inclusivo em simultâneo, a componente económica, da
ram surpresa. e sustentável. Apostámos na dinamização da justiça social, da sustentabilidade ambiental e
economia de Braga que fosse transversal a to- da governança.
Dê-me exemplos do que estava mal feito. dos os setores. A ideia foi aproveitar o que já tí- Fizemos uma forte intervenção social. Fo-
nhamos e dar-lhes sustento. Recordo que nós mos um município, também ele pioneiro, em
A gestão económica. Era muito difícil e de temos uma das melhores academias do país; muitas políticas de resposta às necessidades
difícil compreensão, como é exemplo o Está- demos dimensão ao Laboratório Ibérico In- concretas da população em todas as áreas: ha-
dio Municipal (Pedreira) que ainda há poucos ternacional de Nanotecnologia (INL); a Bosch, bitação (passamos de 200 mil a 2 milhões de
anos teve as últimas decisões no tribunal. A por exemplo, vinha de um processo de lay-off, euros de apoio direto às famílias), educação,
parceria público-privada que acabámos por com uma grande tensão social sindical à volta saúde e qualificação ambiental.
eliminar, um peso descomunal no orçamento dela. Hoje esta empresa é pujante e mais do
da Câmara e do erro que significava em termos que duplicou a sua presença em Braga (4.000
de gestão financeira; questões jurídicas em trabalhadores). O que foi fundamental? Criar Um dos cancros de Braga é o aumento ex-
relação a vários processos; questões de qualifi- mecanismos de contacto entre os agentes, tra- ponencial do trânsito no coração da cidade.
cação e de modernização da própria autarquia. balhar em rede, ligar a academia ao tecido em- O que fez nesta área da mobilidade?
Recordo que havia uma imagem dos ‘carrinhos presarial e internacionalizá-los. Neste capítulo,
de compras’ dos processos do urbanismo que foi fundamental a InvestBraga - Agência para Sobre esta matéria temos de pensar em
circulavam entre os dois edifícios com pilhas a Dinamização Económica de Braga, lançada várias coisas. Em primeiro lugar, a cidade foi
de papéis. Nos últimos anos, foi feito um es- em 2014, primeira em Portugal. Mais do que estruturada, durante todo o seu crescimento
forço de modernização, com a digitalização pioneira foi uma estrutura dinâmica. anterior, para favorecer a utilização do auto-
da tramitação. Hoje tudo é processado digital- móvel. Vemos todas as vias circundantes a
mente. serem encaminhadas para o centro da cidade.
Contudo, havia outras áreas muito deficitá- Quando há anos, tínhamos uma Rodovia, uma
rias em termos de recursos humanos. Não tí- Padre Júlio Fragata, António Macedo, aveni-
nhamos gente licenciada para tratar de certos das dentro do espírito da VCI, hoje é impensá-
assuntos. Em suma, havia um déficit na estru- vel olhar para elas dessa forma. Há um ranking
turação da Câmara quer em termos financei- que nós não gostávamos de estar em primeiro
ros, como jurídicos e de recursos humanos. Havia uma imagem lugar: de acordo com o último Eurobarómetro,
dos ‘carrinhos de Braga é a cidade que detém a maior percenta-
Podemos garantir que hoje a Câmara Mu- compras’ dos processos gem (60%) de cidadãos a utilizar a sua viatura
nicipal está preparada para o futuro? própria para circular na cidade. Basta pensar
do urbanismo que qual é a cidade que tem maior oferta de esta-
Sem dúvida. A Câmara Municipal de Braga cionamento – incluindo, naturalmente a oferta
tem hoje um modelo virtuoso de gestão, ou circulavam entre os privada, com os parques de estacionamento.
seja, há um aumento de receitas contínuo por Braga tem milhares de lugares no coração da
força do crescimento económico e demográfi- dois edifícios com pilhas cidade. Esse modelo de urbanização não dei-
co do concelho. Este modelo foi desenvolvido de papéis. Nos últimos xou muita margem para intervenções estrutu-
ao longo destes anos com baixas contínuas de rantes em termos de novas vias e novos aces-
impostos (Derrama, IRS IMI), com benefícios anos, foi feito um esforço sos. Se olharmos para a estrutura da cidade,
nas taxas e licenças municipais para diferentes de modernização, onde é possível criar vias? Fala-se na Variante
franjas da população, sem colocar em causa a do Cávado, que é óbvia, e pouco mais. A estru-
sustentabilidade financeira que hoje carateriza com a digitalização tura viária da cidade é a que é.
a Câmara Municipal.
da tramitação. Hoje É equacionável a construção do metro em
Tendo em conta que a Câmara de Braga
tinha sido sempre liderada pelo mesmo ho- tudo é processado Braga?
mem desde o 25 de abril, quando começou digitalmente. O metro é uma estrutura que dificilmente
a sentir que a autarquia já era à sua imagem? seria sustentável. É importante ter outras so-
luções, como por exemplo o BRT (Transporte
Penso que foi instantâneo, mais não seja pelo De acordo com o que oiço, a palavra cresci- Rápido por Autocarro). Neste sentido, a mais
dado histórico. O facto de alguém estar a lide- mento é selo identitário da sua gestão? importante solução que já vai existindo é a
rar uma Câmara há 37 anos, foi fácil acentuar migração para os transportes públicos. Tem
as apostas e as fragilidades que existiam. Foi, O que lhe posso responder é que hoje o cres- de ser a alternativa prioritária. Fizemos uma
por via disso, uma enorme oportunidade por- cimento económico da cidade é uma das suas grande modernização. Havia o estigma de ser
que a possibilidade de fazer diferente e melhor marcas identitárias. Tirando o período da pan- só para pessoas idosas, para jovens que ainda
era muito grande. A Câmara e a sociedade por demia, criámos todos os anos dois mil postos não conduzem ou pessoas pobres… hoje são
arrastamento cedo perceberam os ganhos que de trabalho. Somos o terceiro concelho mais transportes modernos, a maior da nossa frota
foram sendo gerados por essa transformação. exportador do país. No turismo, temos mais de (60%) é verde, isto é, não poluente.
14 JUNHO · 2025 #SIMatuaREVISTA