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ENTREVISTA


                                                                                         Como define o ser humano?
                                                                                         Como dizia Karl Rahner, o ser humano é uma
                                                                                         pergunta, para a qual Deus é a resposta. Nós,
                                                                                         humanos, somos uma grande pergunta. Cristo
                                                                                         continua a ser a resposta.
                                                                                         Vive impotência ou raiva com a cólera que
                                                                                         existe no mundo que nos rodeia?
                                                                                         Não. Não creio que seja possível encontrar
                                                                                         soluções imediatas e fáceis para os problemas
                                                                                         que o mundo enfrenta. O que lhe posso dizer
                                                                                         é que acredito no contributo de cidadãos que
                                                                                         são conscientes, comprometidos. É o caso dos
                                                                                         cristãos, que devem constituir uma comuni-
                                                                                         dade comprometida com a edificação de um
                                                                                         mundo diferente. Também confio que os jovens
                                                                                         saberão fazer a diferença. Há muitos jovens têm
                                                                                         sede de espiritualidade, de autenticidade, de
                                                                                         relações verdadeiramente humanas. O Evan-
                                                                                         gelho pode brilhar de muitas maneiras. Tenho
                                                                                         a convicção de que sempre que a luz do Evan-
                                                                                         gelho se apaga, mergulhamos numa grande es-
                                                                                         curidão. Não é por acaso que Jesus fala muitas
                                                                                         vezes da palavra luz: “sou a luz do mundo”.
                                                                                         Como olha para o Papa Francisco, também
                                                                                         ele um jesuíta?
                                                                                         O Papa Francisco tem sido um profeta. Sabe ler,
                                                                                         com muita clareza, o tempo em que vivemos.
                                                                                         Apesar de ter quase 90 anos, quando o escuta-
                                                                                         mos, temos a impressão de que estamos a falar
                                                                                         de um homem do nosso tempo. É muito desa-
                                                                                         fiador para a própria Igreja. Deseja uma Igreja
                                                                                         que seja fiel ao evangelho. O Papa Francisco é,
                                                                                         sem dúvida, uma resposta de Deus para o nosso
                                                                                         tempo.
                                                                                         Uma das bandeiras da cidade de Braga é a
                                                                                         Universidade do Minho. A seu ver, que papel
                                                                                         representa para o bracarense a Faculdade
                                                                                         de Filosofia que, curiosamente, foi a primei-
                                                                                         ra a surgir em pleno Estado Novo (1967)?
                                                                                         Posso dizer a relação entre a Universidade Ca-
                                                                                         tólica e a Universidade do Minho é de amizade.
                                                                                         Relembro que o primeiro Reitor eleito na Uni-
                                                                                         versidade do Minho foi um jesuíta (Padre Lúcio
                                                                                         Craveiro), que deixou na Universidade uma
                                                                                         marca importante.
                                                                                         Está a cumprir o primeiro mandato. Pode
                                                                                         chegar aos três (9 anos). Acredita que no
                                                                                         final, feitas as contas, pode deixar uma he-
                                                                                         rança com mais “luz”?
               Como olha para o papel dos jovens na Igre-  dos com a Igreja e às vezes nem a conhecem.
               ja?                                                                       É curioso ter colocado a questão nesse termo,
                                                    Equaciona o desmembramento dos valores   com a palavra luz. Porque…agora que penso…o
               Não nego que muitos jovens estão afastados   da Igreja católica?          tema da luz está no lema da Faculdade de Fi-
               da Igreja, muitos mais do que há décadas. Há                              losofia e Ciências Sociais – “Sob o esplendor da
               certamente mais trabalho a fazer, com especial   Não creio que a Igreja vá desaparecer. Até acre-  vossa luz”. Nem tinha pensado nisto. A vocação
               incidência na formação de futuros padres e dos   dito que podemos estar a viver um processo im-  da Faculdade é justamente refletir esta luz. Ser
               cristãos em geral. Não creio que haja uma gera-  portante de renovação da própria Igreja. Pode   um pequenino farol na nossa cidade, na nossa
               ção perdida. Continua a existir uma juventude   ser um processo purificador. Em geral, no Oci-  região e no país. Um reflexo da luz da verdade
               católica com muita vitalidade. Agora há que re-  dente, a Igreja tem alguma dificuldade na co-  e da esperança, próprias de um humanismo
               conhecer que a Igreja tem uma certa dificulda-  municação com os jovens. O mesmo acontece   genuinamente cristão. Na Universidade, traba-
               de em chegar aos jovens. Isto não é de agora. O   com os partidos políticos. Não irá desaparecer   lhamos com jovens e eles estão cheios de es-
               decréscimo das vocações já vinha a acentuar-  porque, de certa forma, tem uma resposta que é   perança. Precisamos de fazer brilhar com a luz
               -se e não podemos negar que estamos a viver   muito convincente às grandes questões do ser   da esperança. Sinto um grande privilégio, como
               em Portugal um processo de secularização. A   humano. Aquilo que é importante é que a Igreja   Diretor, em poder contribuir para a formação de
               Igreja passou a ter uma presença menor na so-  seja capaz de mostrar o rosto de Cristo. O que   futuros homens e mulheres ao serviço do nos-
               ciedade, o número de cristãos vai diminuindo,   atrai os homens e mulheres de todos os tempos   so mundo. Da minha parte, gostava de ser visto
               os jovens, em geral, estão menos comprometi-  é o Evangelho.              como alguém que reflete esta luz.



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