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EVENTO


               ENTRE O RELVADO E AS ESTRELAS, O


               MANTA PROMETE LIGAR-NOS ÀS ALTAS

               FREQUÊNCIAS DO UNIVERSO

               C           omo já é habitual, a temporada cultural d’A Oficina abre-


                           -se no jardim do Centro Cultural Vila Flor (CCVF) com
                           mais uma edição do Manta, cujas datas já podemos reser-
                           var nos nossos calendários: 13 e 14 de setembro. Este ano,
                           o  cartaz  aposta  na  revelação  de  artistas  internacionais
                           que justificam o sentido total de descoberta em alguns
               casos, e de absoluta confirmação noutros. Segundo Rui Torrinha, diretor
               artístico do CCVF e de Artes Performativas d’A Oficina, “poder ouvir Still
               Corners, MALVA, Billie Marten (em estreia absoluta) e Meskerem Mees
               em duas noites consecutivas, é configurar o relvado do Centro Cultural
               Vila Flor num ponto radiante do universo e fazê-lo ressoar pela poética
               única e intransferível de quem canta deste jeito. O Manta toca-nos no ín-
               timo, porque vem de lá. Tal como a música que, delicada, nos devolve a
               confiança na beleza.”.
               Vivemos na urgência de calibrar um ritmo que nos devolva o significado de
               presença. E também a importância de criar mundo a partir de uma imagina-
               ção cultural fértil e coletiva. Esse ritmo calibra-se por vezes na descoberta de
               novas canções ou na manifestação vocal de artistas que nos ligam às altas
               frequências do universo. É assim o Manta. Começamos sentados na relva e
               depois sentimos o espírito subir, subir, subir, vitalizando esse precioso sentido
               de presença e a também força da energia comunitária.     
               Com entrada gratuita, no habitat que lhe deu origem, o jardim do Centro
               Cultural Vila Flor, o Manta abre no dia 13 de setembro, às 21h30, com MAL-
               VA, um projeto de Carolina Viana que se deu a conhecer em redoma (dupla
               portuense de sonoridade rap e ritmo desconstruído e poético que formou
               com a produtora Joana Rodrigues). Em 2023, Carolina Viana deu um passo a
               solo para fora da redoma, em busca de uma linguagem individual, assumindo   cais, a guitarra solitária suspira uma melodia efémera que se aloja no nosso
               a personalidade artística de MALVA, com o lançamento do seu álbum de es-  cérebro, mergulhando-nos numa febre hipnótica cujas ressonâncias, temos
               treia “vens ou ficas” (incluído em diversas listas de melhores discos nacionais   a certeza, assentarão como uma luva nos matizes dos jardins do CCVF. 
               do ano), onde é possível conhecer um universo introspetivo e de reflexão,   As honras de encerramento cabem a Billie Marten, que se estreia em ab-
               através da voz, guitarra acústica, baixo elétrico e violoncelo.  
                                                                      soluto no nosso país. Billie Marten é uma artista que serve dois mestres. Se
               A partir das 22h30, o palco irá pertencer aos Still Corners, projeto musical de   a intenção for analisar cada palavra que ela canta, será fácil encontrar uma
               Tessa Murray e Greg Hughes, formado em 2009, quando Murray encontrou   profusão de reflexões luminosas sobre temas como o amor, a perda e o ama-
               Hughes, por acaso, numa estação de comboios, em Londres. Esse encon-  durecimento. Se o objetivo for apenas um som de fundo suave e melódico
               tro casual fez com que, ao longo da última década, a banda tenha lançado   enquanto fazemos qualquer outra coisa, bem, a música de Marten também
               uma torrente de temas que são ao mesmo tempo meditativos, exploratórios   é ótima para isso. Em “Drop Cherries”, o seu quarto álbum lançado em oito
               e românticos, navegando num desert noir cintilante que se inspira na aura   anos, a cantautora norte-americana impõe ao ouvinte uma espécie de autor-
               mística das vastas paisagens do deserto, premonitórias e enigmáticas. Em   reflexão hipnótica. A sua voz aveludada conduz-nos pelo caminho intricado
               abril deste ano, os Still Corners lançaram o seu sexto álbum, “Dream Talk”, um   de um relacionamento, passando por turbulências e culminando num mo-
               trabalho com dez temas primorosamente arranjado, elegante e nostálgico.   mento singular envolto pelos sentimentos avassaladores do amor. O álbum
               Da abertura outonal de “Today is the Day” até à conclusão de uma quente   imerge  numa  divagação onírica  onde  as  letras,  baseadas  nas  histórias de
               noite de verão com “Turquoise Moon”, os Still Corners criaram, neste longa-  Marten, são nebulosas, como se estivéssemos a ver um filme antigo. Todos
               -duração, um som melancólico, gracioso e sedutor que teremos o privilégio   sabemos que quando Billie Marten lança um novo disco nos espera um folk
               de ouvir, ao vivo, no Manta.                           aveludado, salpicado com letras introspetivas e poéticas e uma composição
                                                                      cuidada e atenta. Não há muitos artistas aos quais possamos confiar, ano
               No dia seguinte, 14 de setembro, os jardins do CCVF abrem-se para uma tar-  após ano, álbuns excelentes. Billie Marten está entre eles, entre os melhores
               de em família. A partir do universo da música haverá oficinas de experimen-  deles, e disso seremos testemunhas nesta edição do Manta.
               tação musical para todas as idades. A cargo da WeTumTum, estas oficinas
               têm como objetivo desmistificar a construção e execução da música, edifi-   Após os últimos concertos de cada noite, a música prolonga-se com dj sets
               cando de forma lúdica e informal experiências que permitem cultivar o corpo   que estendem a vivência nos jardins do CCVF. Na primeira noite, o dj set
               e a mente usando os instrumentos. Sem complicar, e brincando, aprende-se,   estará a cargo de Berto, natural e residente da cidade, colecionador desde
               e a jogar edifica-se. Denotadas pelo à vontade e boa disposição, estas ofici-  2012 e digger aficionado, que traz consigo uma seleção de discos dançantes
               nas são uma possibilidade de fazer e compor música em grupo, através de   com bpms baixos e melodias quentes. A última noite desta edição do Manta
               experiências e desafios que mexem com instrumentos ao alcance de todos.    fecha com um dj set de Tam. A produzir música desde o início do século XXI,
                                                                      Tam decidiu abrir a sua própria editora em 2010, o que o torna músico, gestor
                                                                      de editoras e cofundador da Wasser Bassin Records. Musicalmente falando,
               A segunda noite do Manta recebe, às 21h30, a singer-songwriter belga, Mes-  Tam gosta de diversidade, versatilidade, melancolia, chuva fria de inverno e
               kerem Mees. Armada apenas com a sua voz intrigante, a viola acústica e o   tardes suaves de verão. O encontro está marcado.
               violoncelo da sua amiga Febe, Meskerem transforma as suas músicas no
               mais doce dos deleites auditivos. Os momentos instrumentais trazem uma
               tonalidade melancólica, o violoncelo chora as suas plangentes notas musi-

               44                                                JULHO · 2024                                #SIMatuaREVISTA
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