Page 78 - SIM 287
P. 78
SAÚDE
COMO PODEMOS
MUDAR?
Q ueixamo-nos da vida que temos, daquilo que não gos-
tamos ou das pessoas com quem privamos. A vida rara-
mente é como imaginamos ou queríamos que fosse. A
pergunta que nos podemos fazer é: E nós somos?
É hábito queixarmo-nos de tudo e esperar que o mundo
mude, que se ajuste a nós para que possamos ser feli-
zes. Isso parece-me uma utopia, o mundo não se ajusta
a nós, somos nós que aprendemos a nos ajustar, a con-
tribuir para criar o mundo que queremos ver e onde de-
sejamos viver. Querer que os outros mudem para que
eu possa viver a minha vida tal como desejo é um sonho
de criança. O que acontece é que eu não me reconhe-
ço competências de adulto e, por isso, apenas me resta
esperar que os outros mudem para satisfazer as minhas
necessidades.
À medida que vamos crescendo e amadurecendo na
vida, adquirimos competências para nos adaptarmos veis para casar ou constituir família? Não me parece….
e criar a vida que almejamos. Nem sempre é como so- É como se um mecanismo de defesa no seu interior es-
nhamos, mas esse desejo de fazer acontecer ajuda, em tivesse ao comando para evitar que sofra e veja sofrer.
muito, a fazer que aconteça. Esta é uma posição ativa, O esse mecanismo faz é garantir que as situações que
de criação e contributo para a vida, de aporte para que podiam levar a esse sofrimento, não acontecem. Mas
algo novo surja e a mudança continue a ocorrer como gera outras…
parte do processo de criação.
O que comanda essas nossas decisões inconscientes
E o que acontece quando a nossa vida não é como são crenças: o casamento só traz sofrimento, os pais não
esperávamos que fosse? O que significa não estar protegem os seus filhos, desconhecidos são sempre
satisfeito com a vida que temos? uma ameaça, aqueles que amamos fazem-nos sofrer,
Significa que temos a oportunidade de a criar. Significa qualquer pessoa pode abusar de nós…. Enfim, podem
também que ainda não descobrimos o que nos está a ser inúmeras as crenças que acabam por determinar, de
impedir de o fazer. Sim, não é uma questão apenas de forma inconsciente, as escolhas que fazemos na vida.
ganhar competências, é também uma questão de nos Para cada situação das nossas vidas sobre a qual nos
libertarmos das cordas que nos prendem ao chão e dos queixamos, há uma história por contar, há informação
sacos de areia que nos estão a impedir de voar mais alto que mantemos guardada no nosso inconsciente por
e descobrir outros territórios. medo de aceder a ela.
E o que nos pode estar a impedir então? E então o que fazer? Como podemos nós mudar?
São mutas as coisas que nos impedem de crescer, de Primeiro, é preciso querer mudar e não esperar que
mudar, de aprender, de criar uma versão nossa mais tudo fique na mesma. Se é para mudar, se é para crescer
compatível com a vida que queremos ter. A vida que e transformar a nossa vida numa versão mais conscien-
vivemos durante a nossa infância condicionou-nos, os te e madura, não podemos tentar prever tudo – isso é o
traumas que guardamos, as histórias que ouvimos, as medo a falar. Não controlamos nada fora de nós, apenas
coisas que presenciamos… Tudo isto nos impacta e mol- controlamos a forma como entramos na experiência e
da na maioria das vezes de forma inconsciente, acaban- nos deixamos conduzir por ela. Por esse motivo, tam-
do por determinar a maneira como abraçamos a vida e bém não é possível querer que a nossa vida mude e de-
Ana Raquel Veloso os desafios que esta nos apresenta. sejar que sejam os outros a fazer esse trabalho. Esse é
Academia de Fitness Emocional Tudo o que vivemos e experienciamos alimenta o nosso o passo que garante que tudo fica na mesma ou talvez
www.academiafitnessemocional.com piore…
sistema de crenças, aquilo em que acreditamos e nos
orienta na vida. As nossas decisões são baseadas nos A capacidade para mudar a nossa vida está em nós,
nossos valores e crenças, sejam estes conscientes ou as competências têm de ser desenvolvidas por nós, as
não. aprendizagens são para nós, os desafios e as dores tam-
Imaginemos alguém que em criança assistiu a situações bém, muitas vezes são estes últimos que nos mostram
de violência doméstica e em adulto decidiu tornar-se o caminho.
polícia. Ou alguém que tivesse sido abusada em criança O que é preciso então para iniciar este caminho de
e que tivesse decidido tornar-se advogada. Aqui vemos mudança e transformação?
como uma vivência de infância pode ter orientado de
forma (mais ou menos consciente) uma escolha pro- É diferente para cada um de nós, uns precisam de che-
fissional. Mas, se essa mesma pessoa tivesse abraçado gar a um ponto limite, outros decidem quando o des-
outra profissão qualquer e tivesse chegado aos 50 sem conforto começa a manifestar-se, somos todos diferen-
casar e sem filhos? Teria sido uma decisão consciente? tes e isso precisa de ser respeitado.
Provavelmente não. No entanto, há três coisas que todos precisamos de ter
Talvez de forma inconsciente estivesse a tentar evitar quando decidimos empreender esse caminho: cons-
sofrer como a sua mãe e a evitar que outras crianças ciência de que não controlamos tudo, muita vontade de
sofressem como ela. Teria pensado nisto tudo quando o fazer e coragem para permanecer nele até os frutos se
decidiu envolver-se sempre com pessoas indisponí- começarem a ver.
78 OUTUBRO · 2023